Uma amiga do grupo de engenheiros do Mackenzie compartilhou um vídeo sobre a Irmandade da Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores.
Esta pequena igreja é curiosa por não pertencer a nenhuma Arquidiocese católica. Trata-se de uma igreja particular que pertence aos descendentes de seus fundadores em 1750. Esses fundadores foram mercadores e comerciantes que se reuniam quase todas as noites num oratório na região, na esquina da Rua do Ouvidor com a Rua Arco do Teles, na cidade do Rio de Janeiro, a menos de um quilómetro do Aeroporto Santos Dumont.
Curiosamente e até por não pertencer à Arquidiocese do Rio de Janeiro, a pequena igreja pode manter a tradição de ter missas solenes todo sábado e domingo ao meio-dia, proferida em latim. Ricamente ornamentada com madeira nobre trabalhada, pratarias religiosas de todo tipo e alfaias antigas.
O meu lado mais cético tende a analisar essa irmandade e o lugar de culto com a razão. Razão é quase o antônimo de fé. Para esse lado racional fé é um embuste, uma trampa usada para o engano e subserviência dos crentes para fins negativos. Como pensador racional e estudante da ciência, fé me parece uma forma de afastar o homem da verdade, do conhecimento. A figura da fruta do conhecimento do bem e do mal sempre me pareceu uma trapaça de um Deus egoísta e ciumento, não da serpente ou do diabo que ela representaria. A obediência que abdica do saber não me parece enaltecer ao homem. Como seria um Criador que daria inteligência, consciência da existência e até domínio sobre todos os seres viventes, mas que negasse a necessidade indisputável de aprender?
A fé neste contesto é o oposto do bom e do correto.
Mas eu seria um mentiroso se negasse o efeito que essas arquiteturas sacras têm sobre mesmo um cético como eu. Então como poderia negar o impacto que podem ter sobre aqueles que não querem ponderar sobre o sentimento e querem apenas mergulharem na hipnose que esses locais têm no conforto do místico e do transcendental.
Entrar numa catedral gótica, montada para despertar sensações do divino e ouvir órgãos com músicas sacras ou apresentado gravações do coral “The MormonTabernacle” provoca sensações intensas. Carrega o ouvinte a um estado de hipnose que atua de forma indiscutível na mente humana. Despertam talvez o que Jung chamou de inconsciente coletivo àqueles expostos a esse clima. É como se entrássemos num outro universo que não o da realidade.
Por que negar ao crente esse tipo de fé? Por que negar a satisfação que lá pode ser vivenciada? Este tipo de fé não é a fé para enganar, mas para, talvez, deixar-se enganar e poder viver esse transe prazeroso e surreal. Boa missa em latim à Irmandade. Aproveitem essa agradável droga transcendental nos seus sentidos!
Como vocês devem saber, apesar de deus, minha vida nunca foi fácil. Não deveria ser assim, afinal meu pai é Zeus e minha mãe Hera. Foi aí que começaram meus problemas. Não tenho certeza se minha mãe teve alguma outra relação fora do casamento, coisa muito comum no Olimpo. Eu, Hefesto, nasci feio de dar dó. Tão feio, mas tão feio, que ao me ver pela primeira vez, Hera levou um susto tão grande que me atirou do Olimpo, num impulso. Uma queda e tanto, hão de convir. Acabei por me esborrachar em Atenas. Não fosse eu também um deus e já Hera! – essa foi boa, não foi?
Muito bem, não morri na queda, mas fiquei aleijado. Sim, sou um deus horroroso e coxo!
Em Atenas, mesmo deus, a coisa não foi fácil. Para agradar o povão acabei adotando ser o deus do trabalho, dos artesãos, dos escultores e da metalurgia. Isso mesmo, fui um dos primeiros metalúrgicos da história. Deveria ser o ídolo dos Partidos dos Trabalhadores. O uso de barba dos integrantes desses partidos, vem, creio eu, do meu costume de sempre ter a barba por fazer. Feio do jeito que sou, fazer a barba para quê?
Em Atenas a metalurgia era coisa séria. Para começar, era preciso lidar com fogo. Fogo de verdade, não fogo de bebedeira como acabou por acontecer nos dias modernos com meus seguidores. Em Roma me chamavam de Vulcano, lembrando as larvas fumegantes.
Metalurgia era a base da produção de espadas, escudos e outros artefatos de guerra. Marte, Atena, Ares, Odin e até Ogum eram clientes contumazes. Assim domei o bronze, o ferro e inventei o aço. Forjei até pregos, daqueles usados na crucificação de Jesus. Disso não me orgulho, mas foi para a história.
Trabalho era coisa séria e penosa. Não havia sindicatos nem coisa parecida. Nada de CUT ou PT. Eu, um deus, não era visto em comícios ou manifestos. Eu sempre trabalhei e dei exemplo, com minha ação.
Hoje, confesso, estou envergonhado com o que estão fazendo com minha imagem. Justo eu, nascido feio a ponto de minha mãe ter me jogado do Olimpo, estar preocupado com o que estão fazendo com minha imagem? Entretanto estou, e muito! Pois minha feiura sempre foi uma feiura na aparência, nunca na conduta. O que estão fazendo comigo é corromper minha própria alma.
Vagabundos do mundo atual! Eu os vomito da minha garganta marcada das queimaduras do fogo e manchada da fuligem que respiro.
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