WAGNER RODRIGUES POETA E CRONISTA

TEXTOS ORIGINAIS E PUBLICADOS NOS LIVROS DO AUTOR

Minha tia (Poema de No limite da consciência)

O trem singrava pela mata muito densa

Cortada há tempos através da serra fria,

Furava morros e se arriscava entre os abismos

Com a força bruta da braçagem incansável

Atenta às ordens da fiel maquinaria.

Manacás corriam pelo verde das montanhas

Com nuances ternas dos seus tons de violeta,

A pleno sol ou sobre as sombras mais escuras

Torciam pescoços que espiavam das janelas

Num torpor hipnótico de novidade e formosura.

Corredeiras ágeis se esgueiravam sob os trilhos

Polindo um brilho de humidade aos pedregulhos,

Trocavam prozas num cochicho indecifrável

Com samambaias e o musgo denso das beiradas

E se perdiam, mais abaixo, sob os arbustos.

Uma casinha, em dissonante, aparecia

Tão improvável que os olhares arrematava…

Quem poderia valer-se dela, lá, tão remota,

Quantas histórias, essas pessoas… imaginava

Pela janela, em reflexão, a minha tia.

E eu, menino, ao lado dela, então criava

Algum romance dessas pessoas lá do mato

Que esperavam o trem passar para que lembrassem

Que existiam, que amavam e que sofriam,

Ouvindo o apito e ronronar da ferrovia.

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