
Como vocês devem saber, apesar de deus, minha vida nunca foi fácil. Não deveria ser assim, afinal meu pai é Zeus e minha mãe Hera. Foi aí que começaram meus problemas. Não tenho certeza se minha mãe teve alguma outra relação fora do casamento, coisa muito comum no Olimpo. Eu, Hefesto, nasci feio de dar dó. Tão feio, mas tão feio, que ao me ver pela primeira vez, Hera levou um susto tão grande que me atirou do Olimpo, num impulso. Uma queda e tanto, hão de convir. Acabei por me esborrachar em Atenas. Não fosse eu também um deus e já Hera! – essa foi boa, não foi?
Muito bem, não morri na queda, mas fiquei aleijado. Sim, sou um deus horroroso e coxo!
Em Atenas, mesmo deus, a coisa não foi fácil. Para agradar o povão acabei adotando ser o deus do trabalho, dos artesãos, dos escultores e da metalurgia. Isso mesmo, fui um dos primeiros metalúrgicos da história. Deveria ser o ídolo dos Partidos dos Trabalhadores. O uso de barba dos integrantes desses partidos, vem, creio eu, do meu costume de sempre ter a barba por fazer. Feio do jeito que sou, fazer a barba para quê?
Em Atenas a metalurgia era coisa séria. Para começar, era preciso lidar com fogo. Fogo de verdade, não fogo de bebedeira como acabou por acontecer nos dias modernos com meus seguidores. Em Roma me chamavam de Vulcano, lembrando as larvas fumegantes.
Metalurgia era a base da produção de espadas, escudos e outros artefatos de guerra. Marte, Atena, Ares, Odin e até Ogum eram clientes contumazes. Assim domei o bronze, o ferro e inventei o aço. Forjei até pregos, daqueles usados na crucificação de Jesus. Disso não me orgulho, mas foi para a história.
Trabalho era coisa séria e penosa. Não havia sindicatos nem coisa parecida. Nada de CUT ou PT. Eu, um deus, não era visto em comícios ou manifestos. Eu sempre trabalhei e dei exemplo, com minha ação.
Hoje, confesso, estou envergonhado com o que estão fazendo com minha imagem. Justo eu, nascido feio a ponto de minha mãe ter me jogado do Olimpo, estar preocupado com o que estão fazendo com minha imagem? Entretanto estou, e muito! Pois minha feiura sempre foi uma feiura na aparência, nunca na conduta. O que estão fazendo comigo é corromper minha própria alma.
Vagabundos do mundo atual! Eu os vomito da minha garganta marcada das queimaduras do fogo e manchada da fuligem que respiro.
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